Rememorando as festas do Divino

Rememorando as festas do Divino

legenda: A primeira Festa do Divino deu-se em maio de 1879

Fonte da Foto: Gesiel Júnior

Sacras e profanas, típicas celebrações marcaram época em Avaré

Gesiel Júnior 
    

 

Na Vila do Rio Novo, segundo anotação de Jango Pires, a primeira Festa do Divino deu-se em maio de 1879 durante o paroquiato do padre Antônio Gomes Xavier. Foi festeiro o capitão Timóteo Henrique da Cruz, também conhecido como “Timóteo Barata”.
 

A maioria dos estudiosos acredita que tais celebrações principiaram no Brasil já no século XVI, por iniciativa de portugueses. 
 

No Estado de São Paulo, entretanto, conforme registro do pesquisador Alceu Maynard de Araújo, a primeira localidade a festejar o Divino Espírito Santo, no ano de 1761, foi Guaratinguetá. “Divino era festa organizada usualmente por gente da elite (fazendeiros, comerciantes etc), enquanto a de São Benedito era ‘festa de pobre’”, observou.

Correspondendo à Festa de Pentecostes no calendário oficial da Igreja Católica (em que se comemora a descida do Espírito Santo sobre os apóstolos, 50 dias após a Páscoa), a Festa do Divino é uma das mais tradicionais do país.

Diversões profanas – “A festa do Nhô Juca foi memorável” relatou Jango em referência à organizada pelo tenente coronel José Vicente do Amaral Leite, seu tio, no ano de 1882. “Muito interessante na época, mais interessante hoje e interessantíssima para a geração nova”, avaliou.

Costumeiramente os preparativos começavam duas semanas antes com a chegada de carros de boi transportando produtos para a ocasião. Os veículos desciam a Travessa da Matriz (atual Rua Rio Grande do Sul) e eram acolhidos com entusiasmo por populares. Vinham também doceiros, entre os quais Mestre Chico e Mãe Bárbara, de Sorocaba.

Nesse meio tempo, grupos de devotos empunhando a bandeira do Divino percorriam os quarteirões, ao toque de um tambor, para angariar donativos em dinheiro ou espécie. Um violeiro os acompanhava para agradecer, em versos cantados, aos colaboradores.

A parte profana dos festejos constava de leilões de prendas, levantamento do “pau de sebo”, no alto do qual eram colocados alguns mil réis, e do mastro do Divino, sob a salva de morteiros, queima de fogos e fogueira. 

Outro evento atrativo nessa festa era a encenação de peças teatrais em palco montado na casa do professor João Padilha de Queiroz, no Largo da Matriz. Personalidades importantes, como o intelectual Maneco Dionísio, tomavam parte como atores.

Há um século - Em 1912, tendo como festeiro o capitão Israel Pinto de Araújo Novaes, o Divino foi celebrado no mês de janeiro “com o máximo esplendor, que não foi prejudicado pela chuva, que quase continuadamente se desprendia das nuvens”, noticiou “A Comarca de Avaré”. 

O mesmo jornal informa que esse abastado fazendeiro “não se poupou a despesas para que o Espírito Santo fosse aqui condignamente festejado”. Auxiliaram-no, sorteados no ano anterior, Ludovico Lopes de Medeiros como alferes de bandeira (ele era o prefeito na época) e Joaquim Lopes de Almeida como capitão do mastro. 

A festa abriu-se com a alvorada. Já a solenidade religiosa foi presidida pelo vigário geral do Bispado de Botucatu, monsenhor Paschoal Ferrari. Após a procissão, animada pelos acordes da banda do maestro Itagiba, o povo participou da missa campal na qual pregou o padre José Messias de Aquino. 

Em sua pregação, padre Aquino lembrou aos fiéis “as muitas graças que devem esperar do Paráclito”, expressão de origem grega, cujo significado é “aquele que consola ou conforta; aquele que encoraja e reanima; aquele que revive; aquele que intercede em nosso favor como um defensor numa corte". No sentido cristão esse termo é empregado para se referir ao Espírito Santo. 

Terminada a missa, o pároco saía pelo largo poeirento e enfeitado com coqueiros e bandeirolas coloridas para distribuir roscas preparadas pelas quituteiras. Muitos guardavam pedaços para cura de males como defluxo e tosse comprida. 

“Dezenas de crianças, vestidas de anjos – relembra a cronista Anita Ferreira De Maria – esperavam inquietas a distribuição de cartuchos de papel de seda, todo frisado e cheio de balas e guloseimas”.

Após os rituais sagrados, o tradicional leilão de prendas movimentava a praça central, tendo como atração “belos fogos de artifício preparados pelos hábeis pirotécnicos Miguel Bocci e Paschoal Luciano”, conforme registro da imprensa da época.

Tradição finda – Nas décadas seguintes a Festa do Divino prosseguiu sem muita regularidade. Entre os anos 1930 e 1950, algumas foram promovidas com realce durante os paroquiatos dos padres José Fernandes Tavares e Celso Diogo Ferreira. Nos fim dos anos 1960 a comemoração desapareceu.

Contudo, em 1979, o pároco de Nossa Senhora das Dores, padre Almir dos Santos Pereira organizou a última edição da festa na tentativa, sem êxito, de reativar a antiga tradição religiosa.  

Do livro 'Avaré em memória viva', vol. III, de Gesiel Júnior, Editora Gril, 2012

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