SOBRE O AUDAZ VITORIANO

SOBRE O AUDAZ VITORIANO

legenda: Ainda pouco se sabe do principal fundador de Avaré

Foto Fonte: Arquivo Gesiel Jr.

GESIEL JÚNIOR

            Da audácia de Vitoriano de Souza Rocha para desbravar Avaré se pode ouvir no hino municipal em versos do poeta Djalma Noronha. Porém, da vida desse bravo e forte pioneiro ainda muito pouco se conhece. Major da Guarda Nacional e simpatizante da República, o tropeiro Vitoriano assentou-se no sertão do Rio Novo em meados do século dezenove, antes da Lei de Terras, atraído pela propaganda de seu parente, o capitão Tito Corrêa de Melo, um dos chefes políticos de Botucatu.

            Veio e tomou posse de áreas mais tarde registradas como Fazenda São João do Paranapanema, um latifúndio que hoje ficou submerso desde o represamento das águas de Jurumirim, no início da década de 1960.

            RAÍZES BRAGANTINAS – Recentes levantamentos feitos por um eficiente grupo de pesquisadores da genealogia paulista (dentre os quais se destacam Celso e Junko Prado, Joaquim dos Santos Neto, Paulo Pinheiro Machado Ciaccia e Carlos Eduardo Telles de Menezes) permitiram fossem desvendadas as origens do principal fundador de Avaré, as quais agora vem a lume.

Filho de Francisco Bueno da Rocha e Gertrudes Cardoza de Oliveira, camponeses, “Victoriano” nasceu em Conceição do Jaguari – antigo nome da atual estância climática de Bragança Paulista. Recebeu o batismo na igreja dessa freguesia no dia 7 de março de 1790, tendo como padrinhos Antônio de Souza de Moraes e Clara Cardoza de Oliveira.

            Radicada numa colina, à margem direita do Ribeirão Canivete, a família Rocha ali se dedicava à lavoura. Vizinhava com a capela votiva de Nossa Senhora da Conceição, lugar de descanso para os tropeiros que por ali passavam. Aos poucos, ao redor dessa ermida, surgiram ranchos e barracas.

            Vitoriano, portanto, cresceu em terras bragantinas, no sopé da Serra da Mantiqueira, passagem obrigatória dos aventureiros das Entradas e Bandeiras.

 

Aos 18 anos, casou-se com a adolescente Gertrudes de Oliveira Dorta, de 13 anos, batizada em 26 de abril de 1795, filha de Antonio de Oliveira Dorta e de Florência de Oliveira. Seu matrimônio foi celebrado em 29 de novembro de 1808, na matriz de Nossa Senhora da Conceição, de Nova Bragança.

            Três anos depois nasceu José de Souza Rocha, o primeiro filho, batizado em 3 de fevereiro de 1811. Vitoriano e Gertrudes moraram em Pouso Alegre (MG), onde o casal teve outros cinco filhos: Chispim Rodrigues de Campos, Camillo de Souza Rocha, Pedro de Souza Franco, Antonio de Souza Rocha e João Francisco da Rocha.

            REBELDE EM SOROCABA – Em 1840, segundo relato de Tito Corrêa de Melo, Vitoriano passou temporada em Sorocaba negociando tropas. Experiente, vendia animais para criadores mineiros de Campanha e de Ouro Fino.

Em 1842, tomou parte na Revolução Liberal, apoiou o Regente Feijó e combateu na coluna desbaratada na Venda Grande, próximo de Campinas, pelo Duque de Caxias.

Tempos depois, encontrou-se em Sorocaba com o posseiro José Theodoro de Souza, que estava a caminho de Botucatu para visitar Tito. Ao inteirar-se dos objetivos Vitoriano incorporou-se ao grupo de pousoalegrenses interessados no povoamento do sertão do Paranapanema.

 

Acompanharam Vitoriano em tropas de cargueiros ou em carros de bois, nessa marcha para o Oeste paulista, alguns mineiros do Sul interessados em se apossar de terras agricultáveis, dentre os quais figuravam Domiciano José de Sant’Ana, José Antônio do Amaral, Generoso Teixeira, Francelino de Melo, João Antônio de Souza e Dionísio José Franco.

Ainda conforme descreveu o capitão Tito, o major era um homem alegre, folgazão, valente, domador sem igual e muito devoto. Em 1862, ele foi a Botucatu para doar, em cartório, terras para a formação da futura freguesia e Vila do Rio Novo.

Tito testemunhou e ajudou o primo no seu propósito e assim descreveu os fatos: “Vitoriano tomou posse do chão perto do Rio Novo, conhecido antes por ‘Abaré’, nome dado pelos índios caiuás que habitavam a margem direita. Depois, ele e seu vizinho e compadre Domiciano me procuraram para levá-los à casa do tabelião Francisco Antônio de Castro. Aí redigi a escritura de doação que ambos faziam, na parte em que seus sítios dividiam, cortados por um riacho ou córrego, de um terreno de quarto de légua (ou 27 hectares) para o Patrimônio de Nossa Senhora das Dores. Essa escritura foi lavrada em 15 de maio de 1862. Nesse tempo já havia um cruzeiro em frente da capela e oito casinhas de pau a pique, cobertas de sapé. Foi esse o princípio da Vila do Rio Novo”.

SUB-DELEGADO – Com a criação, em 1866, do Distrito Policial de Nossa Senhora das Dores do Rio Novo, Vitoriano tornou-se o sub-delegado com jurisdição sobre os territórios de Santo Antônio da Boa Vista (Itaí), São João de Itatinga (Itatinga), São Domingos (Águas de Santa Bárbara), São Sebastião do Tijuco Preto (Piraju) e São Francisco do Macuco (Cerqueira César).

Ocupou esse encargo por pouco tempo. É a última referência ao major nos escritos históricos mais antigos. Ele, enfim, viveu de maneira discreta e recolhida em sua propriedade rural, onde hoje é o Bairro dos Rocha.

Gertrudes, a esposa de Vitoriano, que também assinou a escritura de doação da área onde surgiu Avaré, morreu aos 84 anos de idade, no dia 5 de maio de 1879. O major faleceu meses depois, aos 90 anos, no dia 28 de março de 1880. Seus restos mortais se acham inumados sob a escadaria do Lar São Vicente de Paulo na área onde ficava o primeiro cemitério da cidade.

 

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“Calou-se o forte, audaz e rude sertanejo.

O sol doura-lhe a fronte em tépido bafejo,

Como a exprimir em luz e em calidez também

Um grande, refulgente e silencioso amém!”

 

Djalma Noronha em

“O sonho de Vitoriano”

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- Do livro ‘Avaré em memória viva’, vol. III, de Gesiel Júnior,

Editora Gril, 2012

 

Rara imagem fotográfica de Victoriano de Souza Rocha, 1880.

Assentamento do batismo de Victoria9no de Souza Rocha, 1790.

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