Morre o ex-prefeito Fernando Cruz Pimentel

Morre o ex-prefeito Fernando Cruz Pimentel

legenda: Seu corpo está sendo velado na Sala 5 do Velório Municipal e o sepultamento está marcado para as 17h

Fonte da Foto: Gesiel Jr

Faleceu na madrugada desta segunda-feira, 02, o ex-prefeito Fernando Cruz Pimentel, que nos últimos dias passou por situações que o acometeram a ficar internado por duas vezes na Santa Casa de Misericórdia. Primeiro foi vítima de um Acidente Vascular Cerebral (AVC), e na sequência voltou a ficar hospitalizado vítima de uma torção seguida da quebradura de um dos pés.

Dr. Fernando, que tinha 89 anos, morreu por volta das 2h da madrugada e seu corpo já está sendo velado na Sala 5 do Velório Municipal. O sepultamento do ex-prefeito está marcado para as 17h desta segunda-feira. O prefeito recém empossado, Jô Silvestre, num de seus primeiros atos oficiais, decretou luto oficial por três dias.

FERNANDO CRUZ PIMENTEL

- O homem que mais governou Avaré -

Ex-prefeito é modelo de gestor público

* Gesiel Júnior

Por cinco mil dias, em três mandatos e em fases distintas, Fernando Cruz Pimentel administrou Avaré. Foi ele o precursor do município como estância turística.

A propósito, a sua lúcida trajetória de 14 anos à frente do Poder Executivo serve de oportuna reflexão para os que hoje desempenham cargos eletivos numa época marcada negativamente pelos estigmas da corrupção no setor público.

Dono de memória prodigiosa e de boa saúde, o doutor Fernando caminha com disposição e, muito embora se sinta mais só por conta da viuvez, ainda emprega parte de seu tempo zelando pelas terras que herdou do pai em Itararé.

Há duas décadas longe da lide administrativa, o respeitado ex-prefeito já sabe que tem assento merecido na história avareense. Afinal, ele é o governante que – com lisura e habilidade - por mais tempo cuidou da cidade no século vinte.

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Herdeiro de um clã influente

Quando Fernando nasceu, em 24 de maio de 1927, numa casa no Largo São João, a sua família influenciava na alta cúpula da política paulista. O coronel João Cruz, seu avô materno, aliado de Júlio Prestes, liderava o Partido Republicano no Vale do Paranapanema.

Avaré, então administrada pelo seu tio, o médico José Bastos Cruz, o doutor Zezé, ainda mantinha no campo a sua base econômica.

Outro tio, o advogado e aviador Mário Bastos Cruz, chefe de Polícia de São Paulo (cargo equivalente hoje ao de secretário da Segurança Pública), havia mandado construir o primeiro aeroporto local e chegou a ser cotado para governar o Estado, o que não ocorreu devido aos efeitos da Revolução de 1930.

Nesse ambiente o menino cresceu orientado pela mãe Maria Izabel, a dona Nenê. Educada com esmero em colégio interno, ela foi a primeira mulher a ter carteira de motorista na cidade. Falava fluentemente o francês e com ela Fernando aprendeu a ler o jornal O Estado de S. Paulo, um dos melhores do país.

No início da ditadura Vargas seu pai, Públio Pimentel, cirurgião-dentista, assumiu a Prefeitura por alguns meses. Por pregar democracia em pleno Estado Novo, ficou detido dois meses em São Paulo pela polícia do interventor Adhemar de Barros. O fato impressionou Fernando e os irmãos Hélio, Paulo e Norma, os quais passaram a infância entre vastos cafezais.

Alfabetizado no tradicional 2º Grupo Escolar (Escola Maneco Dionísio), Fernando também estudou no Ginásio do Estado (Escola Cel. João Cruz) e prestou o serviço militar em Botucatu. Depois, na Capital, morou numa pensão da Avenida São João e foi aluno do Colégio Oswaldo Cruz. De 1948 a 1950 viveu em Curitiba, onde diplomou-se em odontologia pela Universidade do Paraná.

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Do gabinete dentário ao Paço Municipal

Por alguns anos o jovem dentista atendeu em seu consultório na Vila Nenê, residência dos pais, no centro histórico de Avaré. Aos 30 anos, em 1957, Fernando desposou Maria Diva Contrucci, moça de ascendência italiana. Dessa união nasceram duas filhas: Maria Isabel e Maria Helena, as quais lhe deram três netos.

Simpatizante da União Democrática Nacional, Fernando conviveu de perto com lideranças nacionais e regionais da UDN como Carlos Lacerda, Abreu Sodré e Paulo Araújo Novaes.

Afastou-se de seu consultório dentário para trabalhar durante pouco tempo no setor de telecomunicações, no norte do Paraná, onde dirigiu a TV Iguaçu.

Aos 41 anos, em 1968, sem apoio explícito da família (os pais não o queriam envolvido na política), decidiu disputar a Prefeitura de Avaré pela Aliança Renovadora Nacional (Arena). No auge da repressão militar ele venceu o pleito concorrendo como candidato único.

Reelegeu-se em 1976 derrotando cinco adversários no princípio da abertura política. Em 1988, aos 61 anos, Fernando obteve a terceira vitória nas urnas e se consagrou como o recordista no exercício do poder municipal em Avaré.

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Feitos e defeitos de um administrador carismático

Nenhum homem público é perfeito. Como a história ensina no seu dinamismo, a ação política, por ser controversa, nem resulta apenas em resultados satisfatórios.

Na primeira gestão (1969-1972), aconselhado pelo irmão Paulo Pimentel, então governador do Paraná, Fernando evitou polemizar com os militares. Criou e instalou a primeira faculdade, construiu o parque de exposições e entregou duas obras marcantes: a Penitenciária I e o Camping Municipal. A primeira, após ser palco de rebeliões de presos, de certa forma se contrapõe à segunda, um símbolo do turismo regional.

Na gestão seguinte (1977-1982), a mais longa, Fernando empenhou-se na tentativa de gerar empregos, industrializar o município para redefinir a sua base econômica. Conseguiu instalar a torrefadora de café Melitta e a extinta Staroup, indústria que confeccionava tecidos jeans.

Na mesma época ele apoiou o movimento ambientalista que impediu fossem as águas da Represa de Jurumirim poluídas por uma fábrica de papel e celulose. Em 1980, teve o mandato prorrogado e transferiu os serviços de água e esgoto para a Sabesp.

No terceiro mandato (1989-1992), de modo austero e pragmático, Fernando manteve equilibradas as finanças municipais e, mesmo assim, asfaltou as ruas centrais, inaugurou o novo aeroporto e empenhou-se por uma causa: a redução do elevado déficit habitacional da cidade.

Nessa derradeira gestão ele a concluiu, contudo, respondendo a contraditório processo no Tribunal de Contas do Estado. Por quê? Por despesas elevadas? Não, em absoluto. Foi penalizado por gastar – pasmem! - dinheiro a menos do valor orçado para implantar galerias pluviais no Largo do Mercado, obras essas feitas para evitar enchentes.

De temperamento inquieto, Fernando Pimentel governou Avaré sob permanente tensão e soube usar do diálogo em diferentes contextos para a busca de soluções sensatas. Acumulou mais acertos do que erros. O resultado é que seu nome e seu legado estão grafados na crônica histórica com as tintas perenes do respeito popular mescladas por sentimentos de cidadania.

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* Do livro 'Avaré em memória viva', vol. III,

de Gesiel Júnior, Editora Gril, 2012

 

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